RDC 978/2025 da ANVISA: O Que Sua Empresa Precisa Saber Sobre a Nova Regulamentação de Exames Laboratoriais
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) publicou em 10 de junho de 2025 a Resolução da Diretoria Colegiada nº 978/2025, que estabelece novos requisitos técnico-sanitários para o funcionamento de serviços que executam Exames de Análises Clínicas (EAC). Esta resolução representa um marco regulatório fundamental para laboratórios, farmácias e consultórios em todo o Brasil, trazendo maior clareza normativa e modernização ao setor de diagnóstico laboratorial.
Por Que a RDC 978/2025 Foi Criada?
A nova norma surgiu após amplo processo de discussão envolvendo representantes do setor público e privado, incluindo o Ministério da Saúde, vigilâncias sanitárias estaduais e municipais, além de entidades representativas como SBPC/ML, Abramed, Controllab e conselhos profissionais. O objetivo principal foi superar dificuldades de implementação identificadas na norma anterior, a RDC 786/2023, que vigorou por apenas dois anos.
A atualização foi motivada por avanços tecnológicos, consolidação de modelos laboratoriais e a necessidade de maior padronização técnica, buscando garantir segurança diagnóstica, responsabilidade técnica e integridade das amostras, especialmente em serviços de menor porte.
Principais Mudanças e Impactos
1. Nova Classificação dos Serviços de EAC
A RDC 978/2025 mantém três categorias de serviços, mas com definições mais precisas e escopo melhor delimitado:
Serviços Tipo I (Farmácias e Consultórios Isolados)
- Podem realizar apenas exames com material obtido por punção capilar, cavidade oral, nasofaringe e orofaringe
- Todas as etapas (pré-analítica, analítica e pós-analítica) devem ser realizadas no próprio estabelecimento
- Proibido: receber material autocoletado, armazenar ou transportar amostras biológicas (exceto controles de qualidade)
- Exames têm finalidade de triagem, não diagnóstica confirmatória, nas farmácias
- Em farmácias, apenas o farmacêutico pode executar os exames; em consultórios, profissionais legalmente habilitados
Serviços Tipo II (Postos de Coleta e Consultórios)
- Podem coletar sangue venoso e arterial exclusivamente para fase pré-analítica de laboratórios Tipo III
- Postos de Coleta agora são formalmente reconhecidos como categoria específica
- Podem processar e transportar material biológico para análise no Serviço Tipo III vinculado
- Supervisão técnica presencial obrigatória durante todo o expediente
Serviços Tipo III (Laboratórios Clínicos)
- Podem executar EAC em todos os tipos de materiais biológicos
- Autorizados a desenvolver metodologias próprias (“in house”)
- Podem atuar como laboratório de apoio, recebendo material de outros Tipo III
Serviços de EAC Itinerante
- Reconhecidos como categoria própria e distinta
- Somente Serviços Tipo III podem manter serviço itinerante
- Devem estar regularizados na localidade onde atuam
2. Programa de Garantia da Qualidade (PGQ)
Uma das exigências mais relevantes da nova norma é a obrigatoriedade de implementação de um Programa de Garantia da Qualidade (PGQ) por todos os serviços que executam EAC, incluindo farmácias classificadas como Tipo I.
O PGQ deve contemplar minimamente:
- Gerenciamento de tecnologias
- Gerenciamento de riscos inerentes
- Gestão de documentos e rastreabilidade
- Gestão de pessoal e educação permanente
- Gerenciamento dos processos operacionais
- Gestão do Controle da Qualidade (GCQ)
Importante: Cada estabelecimento deve ter seu PGQ individual e único, mesmo que pertençam à mesma rede.
3. Controle Interno e Externo da Qualidade (CIQ e CEQ)
A RDC 978/2025 ampliou significativamente as exigências de controle de qualidade:
- Obrigatório para todos os Serviços Tipo I, II, III e Itinerante
- Deve ser realizado exclusivamente no próprio serviço (in loco)
- Abrange todos os equipamentos em uso e todos os analitos analisados
- Aplica-se inclusive quando utilizados autotestes
Essa é uma mudança substancial para farmácias e consultórios que realizam exames, que agora devem participar de programas de avaliação externa da qualidade e manter registros sistemáticos de controle interno.
4. Supervisão Técnica Presencial
A norma estabelece requisitos rigorosos quanto à presença de profissionais:
- Supervisor do pessoal técnico deve estar presente presencialmente durante todo o período de funcionamento do serviço
- Não é permitida supervisão remota ou compartilhada entre diferentes serviços
- Em caso de impedimento, deve haver substituto qualificado
- O Responsável Técnico (RT) pode acumular a função de supervisor, desde que observe as normativas do Conselho de Classe
5. Infraestrutura e Climatização
A RDC 978/2025 traz especificações detalhadas sobre sistema de climatização:
- Serviços Tipo II e III: sistema de climatização obrigatório nas salas de coleta e execução de EAC
- Serviços Tipo I: ventilação natural ou sistema de climatização
- O sistema deve controlar temperatura, umidade, vazão do ar, filtragem, velocidade e emissão de ruídos
- Janelas com abertura são permitidas, mas não substituem o sistema de climatização onde obrigatório
6. Monitoramento de Temperatura e Rastreabilidade
A nova norma enfatiza fortemente o monitoramento contínuo de temperatura:
- Equipamentos de refrigeração exclusivos para produtos de diagnóstico in vitro, reagentes e materiais de controle de qualidade
- Registros contínuos de temperatura máxima, mínima e de momento, com rastreabilidade documentada
- Meios de contingência para conservação mesmo em falha de energia elétrica
- Rastreabilidade completa desde a recepção da amostra até a emissão do laudo
7. Notificação Compulsória e Proteção de Dados
- Todos os serviços (Tipo I, II e III) devem notificar suspeitas de Doenças de Notificação Compulsória
- Conformidade com a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) é obrigatória
- Política de acesso a dados e informações deve estar implementada
Prazo de Adequação e Consequências do Não Cumprimento
Os serviços têm 90 dias a partir de 10 de junho de 2025 para adequação completa à norma, ou seja, o prazo se encerrou em setembro de 2025. Estabelecimentos que ainda não se adequaram enfrentam:
- Riscos regulatórios: fiscalização sanitária, multas, interdições
- Perda de credibilidade com clientes, médicos e parceiros
- Impacto financeiro: retrabalho, descarte de reagentes, perdas de amostras
- Comprometimento da segurança do paciente e qualidade dos resultados
Aspectos Jurídico-Sanitários Relevantes
Do ponto de vista do Direito Sanitário, a RDC 978/2025 representa importante avanço na regulação sanitária brasileira. A norma:
- Fortalece a descentralização do Sistema Nacional de Vigilância Sanitária (SNVS), mantendo a competência de licenciamento nos órgãos estaduais e municipais
- Estabelece responsabilidades técnicas claras, reduzindo a dificuldade histórica de localização de responsáveis por irregularidades
- Promove maior segurança jurídica ao detalhar requisitos antes ambíguos na norma anterior
- Alinha-se a padrões internacionais de qualidade laboratorial, como ISO/IEC 17025 e Boas Práticas de Laboratório (BPL)
A conformidade regulatória não é apenas obrigação legal, mas estratégia de gestão de riscos sanitários, protegendo tanto a saúde pública quanto a própria empresa de passivos jurídicos decorrentes de resultados imprecisos ou não rastreáveis.
Recomendações Práticas para Adequação
Para Laboratórios já estruturados:
- Revisar e atualizar o PGQ conforme novos requisitos
- Verificar conformidade do sistema de climatização
- Auditar processos de rastreabilidade e documentação
- Validar registros de temperatura e controles de qualidade
Para Farmácias e Consultórios que realizam EAC:
- Avaliar viabilidade de manter o serviço considerando as novas exigências
- Implementar PGQ completo, incluindo CIQ e CEQ
- Cadastrar-se em provedor de ensaio de proficiência acreditado
- Garantir presença de supervisor técnico durante todo o expediente
- Estruturar área física conforme requisitos de infraestrutura
Para Todos os Serviços:
- Consultar documento de Perguntas e Respostas da ANVISA
- Buscar orientação junto às vigilâncias sanitárias locais
- Considerar sistemas de gestão laboratorial (LIS) para automatização e conformidade
- Promover capacitação contínua das equipes
Conclusão
A RDC 978/2025 representa evolução regulatória necessária para acompanhar as transformações tecnológicas e a diversidade de modelos de prestação de serviços laboratoriais no Brasil. Mais que uma obrigação legal, a adequação à norma é oportunidade para aprimoramento de processos, fortalecimento da qualidade e diferenciação competitiva no mercado.
Empresas que compreendem o alcance jurídico-sanitário da norma e implementam conformidade robusta não apenas evitam sanções administrativas, mas constroem reputação sólida baseada em segurança, rastreabilidade e compromisso com a saúde pública.
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